OS REGEDORES DA FREGUESIA

Quando em 13 de Janeiro passado postámos uma pequena biografia do Eng.º Bastos Xavier, ficou-nos na retina da memória o episódio de não ter sido reconduzido na presidência da Câmara Municipal de Águeda, por discordar dos argumentos que o governo invocou para não reconduzir o regedor de Recardães que, como sabemos, é uma freguesia do nosso concelho.
Esta curiosidade "empurrou-nos" para a pesquisa do que foi e o que representava a figura do Regedor numa freguesia, ou até paróquia, quando estas foram oficialmente reconhecidas, levando-nos até a recordar uma pessoa da freguesia de Valongo do Vouga que desempenhou estas funções. Mas vamos por partes:
A CRIAÇÃO:
REGEDOR: Foi a designação atribuída a alguns magistrados e funcionários em diversos países, com funções variáveis, sendo esta função adotada em Portugal com a reforma administrativa de Mouzinho da Silveira de 1832, pelo que cada paróquia teria um órgão administrativo local (a Junta de Paróquia) e um magistrado administrativo representante da administração central conhecido por Comissário de Paróquia.
Entretanto o Código Administrativo de 1836 substituiu o Comissário de Paróquia pelo Regedor, com competências semelhantes.
AS COMPETÊNCIAS:
As competências dos Regedores eram um tanto ou quanto análogas às dos administradores dos concelhos, agindo subordinados a estes à escala paroquial e, essencialmente, as suas funções consistiam em garantir o cumprimento e a aplicação das leis e regulamentos administrativos, tendo ainda cumulativamente autoridade policial na área da freguesia.
A última regulamentação dos Regedores foi estabelecida pelos Códigos Administrativos de 1936 e 1940, em pleno apogeu do conhecido e apelidado regime fascista.
AS FUNÇÕES:
Entretanto o Regedor deixou de ter as funções de magistrado administrativo, passando a ser o representante do presidente da Câmara e nomeado por este, com exceção dos concelhos de Lisboa e Porto.
Resumidamente as funções passaram a ser a de cumprir e fazer cumprir as ordens, deliberações, posturas municipais e os regulamentos de polícia, levantar autos de transgressão sempre que necessário, auxiliar quando justificável, as autoridades policiais e judiciais de modo a garantir a ordem e a tranquilidade públicas, auxiliar as autoridades sanitárias, garantir os regulamentos funerários, mobilizar a população em caso de incêndio e cumprir e fazer cumprir outras ordens ou instruções emanadas do presidente da câmara municipal.
Repete-se que a figura do Regedor criada pelo Decreto de 20 de Novembro de 1830, foi extinta na sequência da introdução da Constituição da República Portuguesa de 1976, em consequência do golpe de estado de 25 de Abril de 1974, como se sabe.
UNIFORME:
Como autoridade, o Regedor tinha de se distinguir, como hoje, na sua apresentação, através de um uniforme. Este era constituído por uma casaca azul, com um ramo de carvalho em ouro bordado em cada uma das golas, colete de casimira branca, calças azuis, botas e chapéu redondo. A casaca e o colete teriam botões com as armas reais. O chapéu teria o laço nacional e uma presilha preta, na qual estaria gravado o nome da freguesia.
AJUDANTES:
O Regedor tinha ajudantes para as tarefas que ficam esplanadas, designados por cabos de polícia, sendo a sua influência diminuída, à medida em que foram alargadas à intervenção da Polícia Civil (que passou à Polícia de Segurança Pública nas área urbanas) e, mais tarde, da Guarda Nacional Republicana nas áreas rurais.
O REGEDOR NA FREGUESIA DE VALONGO DO VOUGA:
Seria completamente inaceitável passar esta passagem histórica sem se referir um pouco do que foi o Regedor e as suas funções na Freguesia ribeirinha do Marnel: Valongo do Vouga.
Na realidade as suas funções existiram, como sabemos e foram desempenhadas por pessoas que aqui tiveram a sua residência. O último foi MANUEL ALMEIDA BRANCO, pessoa que residiu no lugar da Veiga.
O Sr. "Manuel Regedor", como vulgarmente era tratado e conhecido, que muitos de nós conhecemos, era uma pessoa educada, afável, de bons relacionamentos com a maioria da população e aqui constituiu família.
Ao contrário de alguns dos seus comparsas no cargo, que chegaram a tomar posições e atitudes ditatoriais, não procurava nem se fazia valer da sua autoridade, antes pelo contrário era respeitador e, por isso mesmo, muito respeitado. Não impunha, colaborava com quem quer que fosse, ajudando sempre no seu múnus com elegância e aprumo. Não se fazia valer de horários nem invocava impossibilidades para não colaborar fosse com quem fosse, o dia da semana ou as horas do dia.
Nas suas funções, era obrigatório que a GNR nas suas rondas, necessitava legalmente de comprovar e confirmar a sua passagem e autenticar o seu serviço junto do Regedor, para o qual este sempre se mostrava disponível, além de outras intervenções a que fosse solicitado.
Mesmo junto dos seus descendentes (mormente de seu filho Celestino), não foi possível obter em tempo oportuno uma imagem que pudesse completar melhor este apontamento sobre o Regedor da freguesia de Valongo do Vouga, que, como é fácil de perceber, a sua história está profusamente descrita na Wikipédia, de onde nos socorremos e cujas descrições adaptámos para recordar um pouco da nossa história.
Na toponímia da freguesia de Valongo do Vouga, lugar da Veiga, uma foi dado o nome de Rua do Regedor recordando esta função. Nas funções de Regedor, sucedeu ANTÓNIO GOMES DA SILVA, que residiu em Arrancada do Vouga, na rua Dr. Eduardo da Silva Bastos.
CAPELA E REGEDOR
Foi referida a impossibilidade de obter uma fotografia do protagonista deste naco de história local, para ilustrar este post. Admitimos que para o efeito nada melhor que a fotografia da capela local, que por sinal se situa mesmo frente à residência do Sr. MANUEL ALMEIDA BRANCO, de invocação de N.ª S.ª das Pressas, conforme livro da autoria do Pe. Manuel Domingos Rebelo, com o título "O CULTO A MARIA NA DIOCESE AVEIRO", edição do Movimento dos Cruzados de Fátima, Dezembro de 1989, com a fotografia na capa da belíssima imagem exposta na capela da Veiga.
Respiga-se do citado livro o seguinte: "Nesta invocação o termo "Pressas" não é antónimo de vagares. Esta palavra arcaica significa: apuro, dificuldade, obstáculo, situação crítica. (Cf. Grande Dicionário da Língua Portuguesa). Maria é a Senhora das Pressas, porquanto está pronta para resolver as nossas dificuldades".
É padroeira da capela da Veiga (Valongo do Vouga). A Corografia Portuguesa, tomo II, trat. II, cap. XXII, menciona esta capela ao tratar "Das vilas de Vouga, Brunide e Aguieira":
Também sobre esta capela, o "INVENTÁRIO ARTÍSTICO DE PORTUGAL - DISTRITO DE AVEIRO - ZONA SUL, editado pela Academia Nacional de Belas Artes - Lisboa 1959, tem uma vasta descrição sobre esta capela, a sua construção e a imagem rematando-se que "Houve aqui uma via sacra de cruzes de pedra, de grandes braços, de que restam algumas bases e outros fragmentos".
Por curiosidade, regista-se que sucedeu a Manuel de Almeida Branco, nas funções de Regedor ANTÓNIO GOMES DA SILVA, que residiu em Arrancada do Vouga, na rua Dr. Eduardo da Silva Bastos, e cremos que este foi o último antes da extinção do cargo.