sexta-feira, 18 de julho de 2025

COISAS DE BAÚS - 8

 GUINÉ - 1963--1965

O JORNAL DA CASERNA

 


    Como foi antecipadamente esclarecido, decorre neste mês de Julho o aniversário da nossa partida e estadia, durante dois anos e um mês, em território Africano da Guiné-Bissau, integrando uma Unidade Militar que, como a história tem clarificado, tinha em vista a manutenção da administração portuguesa, neste e em outros territórios daquele continente. Na sorte que nos coube, como a tantos outros jovens que nos idos anos de 60/70, séc. XX, não escapavam a ter de partir, sem garantias de regresso, para estas paragens Africanas e de outras latitudes do mundo.
    A adaptação, com parcas e minguadas informações sobre tudo o que a tais territórios dizia respeito, havia uma formação e informação, antes da partida, principalmente o que se relacionasse com as doenças tropicais, algumas caraterísticas do seu povo, modo de vida, etc., ministrada por Jovens Aspirantes Oficiais Milicianos promovidos, na data de embarque, a Alferes Miliciano.
    Constituía uma pesada tormenta olhar quase diariamente para o calendário - havia quem riscasse cada dia que ia passando - esperando-se ansiosamente que o tempo corresse mais depressa.
    Depois eram as formas que cada um ia "construindo" os seus passatempos, desde tratar periquitos (e outras aves exóticas) com os espetaculares treinos que se ministravam, conseguindo-se que se apresentassem num evoluído estado de domesticação.
    Além dos macacos, primatas que constituíam as delícias dos seus tratadores que, como se sabe, imitavam com algumas peripécias os gestos e outras atitudes humanísticas. Claro que para além de um vasto conjunto de atividades mediante as possibilidades de cada um, dos seus conhecimentos e dos meios que ao seu redor pudessem deitar mão.
    No caso em apreço, também nos dedicamos a um passatempo e vejam para o que nos deu... publicar um jornal.. a que "vaidosamente" intitulamos Jornal da Caserna.
    O termo "Caserna" é subentendido no edifício que servia de dormitório do pessoal militar. Logo devia exprimir uma orientação de conteúdo que tivesse origem no seu interior. Mas nem sempre foi assim. O seu conteúdo era plasmado por passatempos, redações curiosas socioeconómicas locais. E pretendeu ainda ser cópia de um jornal a sério, tendo ficticiamente, como é notório o cabeçalho com aquele título, o "DIRETOR", ADMINISTRADOR e o EDITOR. Todos identificados elementos integrantes dos quadros daquela Unidade Militar.
    Como isto já vai longo, diremos que aqueles elementos foram por nós convidados, sendo o Diretor "HÉRCULES" o escriturário da Companhia, antagonicamente um "magricelas", o Administrador "MASSINHAS" por ser o homem do "pilim" e o Editor (nós próprios) "ZÉ CANGALHEIRO" porque tinha o propósito de, naquela qualidade, publicar o que fosse mais adequado e que, diga-se em boa verdade, nunca o tivesse feito.
    Há ainda que historiar a forma como começou, como progrediu graficamente, face às técnicas que ainda não existiam, o trabalho, enfim, um ror de coisas que só se avaliam comparando o que temos atualmente com o que naquele tempo ainda era desconhecido. Levanta-se, neste caso, a ponta do véu, referindo que na primeira folha  do tamanho A4, o desenho inserido no cabeçalho, da autoria do Alferes Armando Augusto Geraldes Soares, retrata a frente, junto da estrada, do aquartelamento que ocupamos em INGORÉ.
    A estas recordações voltaremos...

sábado, 12 de julho de 2025

COISAS DE BAÚS - 7

     

HISTÓRIAS DA GUINÉ

    Como ficou clarificado no anterior post, está a decorrer o aniversário das inclementes idas forçadas de jovens militares para territórios Africanos, que tinham por missão impedir que os movimentos organizados em guerra de guerrilha, que procuravam obter, pela força das armas, a almejada independência e autodeterminação da parte dominante, neste caso de Portugal.
    No que a nós diz respeito a sorte, pela força da idade, calhou-nos nos anos de 1963 a 1965. Eram dois anos de tempo de vida militar, como é demais sabido, havendo casos, conforme a especialidade, que atingiram cerca de quatro anos de ausência do país, da família, do trabalho.
    E agora restam-nos as recordações do que foi esse tempo, durante o qual também será lógico evidenciar que se criaram laços, e se fomentaram aproximações entre povos e até se constituíram famílias. E as realidades da vida quotidiana lá se  ia desenrolando, criando-se ansiedades quanto ao regresso cujo tempo parecia que nunca mais chegava ao seu términus.
    Os registos dessas recordações iam ficando em rudimentares máquinas fotográficas, como as que aqui se reproduzem. Em cada um dos registos ficam descritas algumas curiosidades, tanto no tempo (aproximado deque nos recordamos), ao modo de vida e às finalidades que representavam.

Foto obtida por volta de 1963/1964. Um edifício junto da estrada principal, a escassos três ou quatro quilómetros da fronteira com o Senegal e que nos serviu de Secretaria da Companhia que ali permaneceu cerca de um ano. O edifício fora alugado aos serviços militares por um imigrante português e que serviu de «local do nosso trabalho» administrativo, em substituição do1º Sargento, que fora evacuado para Lisboa por motivo de acidente de viação, ou seja, éramos o responsável pelo bom andamento do serviço administrativo que era adstrito à Subunidade Militar. Um possível momento de pausa, enquanto não se retomava o trabalho.

Não dá para se perceber. Mas sabemos perfeitamente o que estava nas mãos, nos braços e nos ombros. Local denominado BULA, muito conhecido por se tratar de um nó rodoviário (de terra batida) e local bastante estratégico da guerrilha, nas zonas de Mansoa, Mansabá, Binar, Bissorã. O que transportamos nos ditos membros superiores, não é nada mais, nada menos, que notas do Banco Nacional Ultramarino, entidade que era responsável  pela emissão de moeda em alguns territórios sob administração portuguesa. Como se compreende facilmente tinha acabado de fazer um levantamento, provavelmente para o pagamento do pré. 

Esta foto foi registada na estrada que liga Bissau ao Aeroporto e ficava sobranceira ao Hospital Militar. Pela aparência, será fácil deduzir que estava de licença, de trinta dias, passada relativamente afastado da guerrilha. 
E com uma vantagem; nesta Unidade de Saúde Militar prestaram serviço dois conterrâneos, um deles de Arrancada do Vouga, sobejamente conhecido; o segundo, dos lados de Casal de Álvaro componente da Banda de Música desta localidade e companheiro de trabalho na fábrica de ferragens Amaro, Lda. O Hospital, felizmente, não serviu para a cura de qualquer mal, mas com a condescendência destes dois amigos, serviu sim de hospedagem durante aqueles trinta dias.

Em conclusão, resta acrescentar que mais havia e haverá a contar. Que se guarda para melhor oportunidade .


sexta-feira, 4 de julho de 2025

COISAS DE BAÚS - 6

 O IMPÉRIO COLONIAL PORTUGUÊS

Uma história em 14 de julho de 1964

    Fazer uma explanação sobre os Impérios que existiram no mundo, não é difícil. Afloramos este caso, em particular, para afirmar que Portugal também esteve entre as potencias colonizadoras, ao lado da Inglaterra, França, Estados Unidos da América, Espanha, Bélgica, Holanda e outros países europeus que se evidenciaram na ocupação de territórios asiáticos, sul-americanos, africanos, etc..    
    Sabemos pela história a influência que Roma produziu quanto aos Impérios que dominaram o mundo, principalmente no Norte de África e Médio Oriente sendo por demais conhecidos os Imperadores Romanos que reinaram. Outros Impérios existiram aos quais a história guardou o seu bocado. O que importa, por agora, será recordar e trazer à tona das águas o papel que Portugal desempenhou no que respeita ao desenvolvimento do fenómeno que proliferou e conheceu o seu apogeu nos seculos XV, até  aos séculos XVI, XVII, XVIII e XIX .                                                                                                                                                                                                                              Bula-Guiné (Bissau) 1964
    Na realidade, este pequeno país que possuía apenas o mar para explorar, chegou a ser, já no século XX, a maior potência mundial no que se refere ao Império que dominava. Claro que importa evidenciar quais eram as possessões que só  há pouco   mais de cinco décadas se tornaram independentes por efeito  do golpe de Estado ocorrido em 25 de Abril de 1974, como é conhecido.

    Os territórios que passaram a constituir o Império Português, hoje países independentes, eram Cabo Verde,  S. Tomé e Príncipe, Guiné (Bissau), Angola, Moçambique, Macau e Timor.

 Claro que está implícito, agora, saber-se o porquê deste apontamento histórico; É que como é de mais conhecido, Portugal passou por um período longo de guerra de guerrilha, que se desenvolveu dentro daqueles territórios, apoiados por países  vizinhos ou organizações nestes instaladas, procurando "expulsar" com a força das armas o dominador. O regime político de então mantendo uma decisão em nada condizente com a evolução dos tempos e do que outros países já tinham decidido em conceder por meios pacíficos a autodeterminação e independência desses povos, mobilizou no serviço militar obrigatório todos os jovens que eram colocados a combater os movimentos de libertação em atividade naqueles territórios.

    Assim se verificou que em quase todas as  casas de um Portugal pequenino, havia alguém que era mobilizado obrigatoriamente e "enviado" para aqueles paragens distantes, sabendo-se antecipadamente que o resultado final seria sempre a negociação para uma ulterior troca de poderes.

    Foi assim que em Julho de 1965 - precisamente no dia 14 daquele mês de uma canícula não tão violenta como a que agora sentimos - nos meteram numa cargueiro que detinha o nome de «SOFALA» e, com mais umas centenas de camaradas militares dos diversos ramos das forças armadas, fomos enviados para a Guiné (Bissau). Já lá vão 60 anos!!!!

    É evidente que  esta história não acaba aqui. Antes pelo contrário, começa aqui...

    Com efeito um documento conhecido por Caderneta Militar, no qual era registada toda a carreira militar que os jovens dos anos sessenta e setenta, séc. XX , tinham percorrido nas fileiras das Forças  Armadas de Portugal.

    Ora, será lógico dizer-se que não fugimos a esta obrigatoriedade e no referido documento, além de ouros factos que não importam focar, está escrito o seguinte:

"Página 20 - Ocorrências Extraordinárias:
1963 - Nomeado nos termos da alínea c), do art.º 3.º do Dec. 42937, de 22-4-60 para servir no Ultramar. Embarcou em Lisboa em 14 de Julho com destino ao CTI da Guiné; fazendo parte da CCaç. 462. Desembarcou em Bissau a 21 de Julho, desde quando conta  100% de aumento no tempo de serviço. 1965. Embarcou em Bissau, de regresso à Metrópole, em 7 de agosto, desde quando deixa de contar 100% de aumento no tempo de serviço. Desembarcou em Lisboa em 14 do mesmo mês."

Esta nota recordatória justifica-se por estarmos próximos do dia 14 de Julho, data do aniversário deste acontecimento, que não deixa saudades.

Nota: - Na foto com uniforme de gala, pronto para desfile  que não se  realizou, porque o local, conhecido por BULA, era um importante nó rodoviário da Guiné e sito nas proximidades das instalações militares do Comando de Batalhão de Caçadores 507, em importante zona de guerrilha onde permanecemos cerca de um ano.